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A minha namorada apanhou o bouquet

Um local de paz e reflexão, mesmo tendo ela apanhado o bouquet.

A minha namorada apanhou o bouquet

Um local de paz e reflexão, mesmo tendo ela apanhado o bouquet.

Qua | 17.04.19

Vamos viver a dois?

P.A

Eu acho que sou disléxico. Tenho cá para mim que padeço de algum tipo de dislexia temporal.

Não faço a mínima ideia de como se evaporou aquela década de 2000 a 2010. Parece que um buraco negro (um a sério, não como aquele com 5 dioptrias que a NASA mostrou há uns dias) sugou tudo o que se passou por esses tempos e que os 2019 de hoje são os meus 2009.

 

Tudo seria perfeito e eu viveria feliz na mentira se não tivesse os meus 10 cabelos brancos - coisa que não tinha nos anos 2000 - a recordar-me constantemente que realmente tudo aconteceu. 

 

E sim, mentaliza-te Pedro, a Expo 98 foi há 21 anos e sim, mentaliza-te Pedro, a Lili Caneças continua com os seus 82 ainda hoje. Essa sim outra grande disléxica.

 

Só que de aparência.

 

Mas no meio desta neblina temporal há uma coisa da qual me recordo perfeitamente, que em (grande) parte justifica a proliferação dos meus cabelos brancos: fui viver a dois com a rapariga que apanhou o bouquet.

 

Na altura a troika andava por cá e casais jovens a arrendar casa em Lisboa não dava para mais do que um T0. Ou seja, bem melhor do que agora, em 2019.

No meu caso, foi sair de casa dos pais para ir viver com ela. Que é como quem diz, sair do regimento militar para um workshop de produtos de beleza.

 

Ainda hoje recordo com carinho as 50 flexões matinais.

 

Ora viver num T0 é como viver numa bimby. É caro para caraças, mas tem tripla função. Tem sala, cozinha e quarto tudo na mesma divisão, é só escolher o programa que melhor nos apraz no momento e voilá.

 

Além disso tinha também uma pequenina casa de banho,  que rapidamente se tornou numa espécie de demonstração das da "mala vermelha", só que ou invés de produtos safado-taradotes estava cheio de esfoliantes, bases, máscaras para pestanas, cremes hidratantes, loções de banho, amaciadores, champôs e depois havia um espelho e uma sanita.

Quando dei por mim, já não havia nada. A casa de banho já não era minha.

 

Sem saber, fui viver com o Afonso Henriques.

 

Mas uma coisa que sempre me fez confusão naquela casa de banho, é que além de ser extremamente pequena, conseguiram espaço para o bidé. Era preciso ter um mestrado em trigonometria e saber fazer o pino para conseguir fechar aquela porta sem bater e isso dou mérito ao arquitecto, senão era mais uma ilha dominada por ela.

 

Só consegui salvar a banheira, onde coloquei as minhas únicas duas bandeiras de higiene, o champô e o gel de banho. Por isso é que foi um homem o primeiro a pisar a Lua, se fosse uma mulher ainda hoje lá estava a marcar território.

 

Mas mesmo na banheira o "Afonso Henriques" não parou. Se os gatos urinam para marcar território, as mulheres deixam cabelo. Novelos de cabelo, para ser mais correcto.

 

O mesmo se passou com o único móvel que existia na casa, noutra divisão, no lado do quarto/sala. O movél era composto por duas portas, inicialmente divididas por uma espécie de "Tratado de Tordesilhas" amigável em que eu ficava com a porta da direita e o "Afonso Henriques" com a da esquerda.

 

Foram 6 dias perfeitos.

 

Uma semana depois, tinha perdido uma gaveta.

Um mês depois duas gavetas e um cabide.

Três meses melhorou. Impus-me. Fomos ao Ikea e comprámos um móvel mais pequeno para ela pôr o excedentário e assim recuperar eu o território perdido.

4 meses depois, passou a ser aquele o meu móvel - perdi o armário.

 

Afinal o excedentário era eu. 

 

"Vamos viver a dois?"

Sim. Mas façam partilhas antes. Não sejam mouros como eu.

 

(imagem)

 

P:A

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Este foi o 35º texto da rubrica Palavras Cruzadas, criada em parceria com a Rita da Nova. A ideia é irmo-nos desafiando uns aos outros através da escrita e escrevermos sobre temas que saem um pouco da nossa zona de conforto ou registo. Mas não só entre nós! Vocês também podem sugerir temas e escreverem também se gostarem das sugestões!

Este tema foi sugestão minha, vejam o que ela escreveu no blog dela!

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